Poesia

Porque gosto de sonhar a vida,  gosto de gostar de POESIA...

Aqui fica...

A minha sombra sou eu,
ela não me segue,
eu estou na minha sombra
e não vou em mim.
Sombra de mim que recebo a luz,
sombra atrelada ao que eu nasci,
distância imutável de minha sombra a mim,
toco-me e não me atinjo,
só sei do que seria
se de minha sombra chegasse a mim.
Passa-se tudo em seguir-me
e finjo que sou eu que sigo,
finjo que sou eu que vou
e não que me persigo.
Faço por confundir a minha sombra comigo:
estou sempre às portas da vida,
sempre lá, sempre às portas de mim!

Almada Negreiros




SUBITAMENTE, ESTA TARDE, UMA OSTRA ESPECIAL...

Na sua resignada e imutável sina, ela protege nas profundezas submarinas, com a sua pétrea e disforme carapaça, as liquidas entranhas afrodisíacas que só abre a quem a saiba seduzir.
Era impensável que nesta tosca sepultura o mais delicado e delicioso prazer se acoitasse fazendo estremecer as sensações que as papilas gustativas transmitem a todo o corpo, num frémito de desejo inigualável.
Ela reserva ainda, por vezes, a mais divina, a mais brilhante pérola criada naquele obscuro esconderijo, juntando ao toque, ao gosto, ao cheiro, também o olhar, completando na amálgama dos sentidos o mais orgástico e pleno prazer humano.
Tal como a mulher que amamos, a ostra abre-se e entrega-se só a quem quer.
Só se quer.
Só quando quer...

Rui Felicio





MERGULHO
Caricia de chuva, fragrância de flor, sabor de mel, calor de sol, luz de lua, afago de vento, chilrear de pássaro, são sensações que o mergulho no amor faz experimentar.
Como no mar, tem os seus perigos.
Quando se mergulha não se sabe que escolhos estão abaixo da linha de agua.


Rui Felicio




SE

Se, tu, me ofereceres Pedras
Eu, com elas vou pintar
O verde cor da esperança
Azul, a cor do mar
Minha vida a palpitar

Se, tu, me ofereceres Sonhos
Eu com eles vou tecer
Uma teia de Ilusões
Uma vida com Magia
Ao deitar e amanhecer

Vivendo, vou continuar
Se nada, nada acontecer
Caminho com teu olhar
Com sonhos, ilusões, fantasia
Com esta forma de amar.

RC


Quero dar-te a coisa mais pequenina que houver
bago de arroz
grão de areia
semente de linho
suspiro de pássaro
pedra de sal
som de regato
a coisa mais pequena do mundo
a sombra do meu nome
o peso do meu coração na tua pele

Rosa Lobato de Faria


A FLOR DO EDEN

Volúpia, paixão, carmim
Pétalas macias, de veludo
Tocar-te é um designio, um fim
Nesta vida mais que tudo
Entre as flores és a rainha
Os teus espinhos te protegem
De quem no teu corpo caminha
Dos que te olham e te elegem

Rui Felicio

Esta noite morri muitas vezes, à espera

de um sonho que viesse de repente

e às escuras dançasse com a minha alma

enquanto fosses tu a conduzir

o seu ritmo assombrado nas trevas do corpo,

toda a espiral de horas que se erguessem

no poço dos sentidos. Quem és tu,

promessa imaginária que me ensina

a decifrar as intenções do vento,

a música da chuva nas janelas

sob o frio de Fevereiro? O amor

ofereceu-me o teu rosto absoluto,

projectou os teus olhos no meu céu

e segreda-me agora uma palavra:

o teu nome – essa última fala da última

estrela quase a morrer

pouco a pouco embebida no meu próprio sangue

e o meu sangue à procura do teu coração.


" Fernando Pinto do Amaral "



mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.

pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.

às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.

lê isto: mãe, amo-te.

eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que
não escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.

José Luís Peixoto,


Não sofras, amor não sofras

Não sofras porque não tiveste

Não sofras pelo que não foste

Não sofras pelo que perdeste

Vive o Hoje, ama a vida

Em cada dia renasce

A infância perdida

Os sonhos porque lutaste

As árvores, flores, família

Os amigos, afectos, amor

Deixa-te, tenta, ser feliz

Estamos, aqui em teu redor


Não sofras, amor não sofras

Não sofras porque não tiveste

Não sofras pelo que não foste

Não sofras pelo que perdeste

Vive o Hoje, ama a vida

Em cada dia renasce

A infância perdida

Os sonhos porque lutaste

As árvores, flores, família

Os amigos, afectos, amor

Deixa-te, tenta, ser feliz

Estamos, aqui em teu redor




Morrer é não voltar a estar
à mesma hora,
nos mesmos lugares,
com as mesmas pessoas.
Não aparecer, cada manhã,
como essa luz primitiva
dissolvida nas coisas;
deixar em suspenso os trabalhos,
as viagens em ponto morto.
Alheios aos mares e aos astros.
Morrer é estar quedo, surdo,
cego, mudo, desaparecido,
desligado de todos e de tudo,
mesmo de nós mesmos;
não regressar a casa nunca mais.
Não emitir sinais já, recebê-los tão pouco.
Morrer é não voltar.

Ángel  Guinda


Não digas adeus, ó sombra amiga,
Abranda mais o ritmo dos teus passos;
Sente o perfume da paixão antiga,
Dos nossos bons e cândidos abraços!


Sou a dona dos místicos cansaços,
A fantástica e estranha rapariga
Que um dia ficou presa nos teus braços…
Não vás ainda embora, ó sombra amiga!


Teu amor fez de mim um lago triste:
Quantas ondas a rir que não lhe ouviste,
Quanta canção de ondinas lá no fundo!


Espera… espera… ó minha sombra amada…
Vê que p’ra além de mim já não há nada
E nunca mais me encontras neste mundo!…


Florbela Espanca.



Ao ver o neto a brincar,
Diz o avô, entristecido,
«Ah, quem me dera voltar
A estar assim entretido!
Quem me dera o tempo quando
Castelos assim fazia,
E que os deixava ficando
Às vezes p´ra o outro dia;
E toda a tristeza minha
Era, ao acordar p´ra vê-lo,
Ver que a criada já tinha
Arrumado o meu castelo.»
Mas o neto não o ouve
Porque está preocupado
Com um engano que houve
No portão para o soldado.
E, enquanto o avô cisma, e triste
Lembra a infância que lá vai,
Já mais uma casa existe
Ou mais um castelo cai;
E o neto, olhando afinal
E vendo o avô a chorar,
Diz, «Caiu, mas não faz mal:
Torna-se já a arranjar.»

Fernando Pessoa


Para ti

Fiquei a pensar
Como ajudar
Chegar lá dentro
Fazer companhia
À tua apatia
Partilhar teu estar
Deixa te ajudar

Estou aqui
Conversa comigo
Ouço, escuto
Entendo-te
Estou contigo
Sou Tua amiga

  RC


Desisto por fim
Resisto vivendo
Pensando em mim
Decido querendo
Nesta melancolia
Do ser e parecer
Disfarço a tristeza
Ao amanhecer


RC


 Se vens à minha procura,
eu aqui estou. Toma-me, noite,
sem sombra de amargura,
consciente do que dou.

Nimba-te de mim e de luar.
Disperso em ti serei mais teu.
E deixa-me derramado no olhar
de quem já me esqueceu.

Eugénio de Andrade


Se sentires medo, canta.
Mas se em ti não couber a alegria, não pares de cantar.
Canta. Canta. Canta. Canta. Canta.
Constrói o teu amor, vive o teu amor,
ama o teu amor. De tudo o que as pessoas querem,
o que mais querem é o amor.
Sem ele, nada nunca foi igual, nada é igual,
nada será igual alguma vez.
Canta. Enquanto esperas, canta.
Canta quando não quiseres esperar.
Canta se não encontrares mais esperança.
E canta quando a esperança te encontrar.
Canta porque te apetece cantar e
porque gostas de cantar e
porque sentes que é preciso cantar.
E canta quando já não for preciso.
Canta porque és livre.
E canta se te falta a liberdade."

Joaquim Pessoa


O grito claro

 De escadas insubmissas
De fechaduras alerta
De chaves submersas
E roucos subterrâneos
Onde a esperança enlouqueceu
De notas dissonantes
Num grito de loucura
De toda a matéria escura
Sufocada e contraída

António  Ramos Rosa


me corre lento pelo corpo todo;
amor sem margens onde a lua rompe
e nimba de luar o próprio lodo.

Correr do tempo ou só rumor do frio
onde o amor se perde e a razão de amar
- surdo, subterrâneo, impiedoso rio,
para onde vais, sem eu poder ficar?


EUGÉNIO DE ANDRADE

A tua voz desnuda o corpo,
nem sei se tu o sabes.
Talvez não te apercebas,
ou sou eu a pensar na poesia...
.
Um dia,
quando o Sol espreitar a medo
entre as nuvens de chuva,
encontrarei o som da tua voz?
.
Despes as roupas
e apareces nua.
Os dois, a sós,
a olhar a Lua.
Amiga que não foge e se agiganta
quando o poema a canta!
.
Desnuda o corpo
a tua voz, feita carícia ardente,
como forma eloquente
do amor.
Como um dia de Verão que aquece o mar...


Jorge F.Ferreira Monteiro.



Eu não procuro nada em ti,
nem a mim próprio, é algo em ti
que procura algo em ti
no labirinto dos meus pensamentos.

Eu estou entre ti e ti,
a minha vida, os meus sentidos
(principalmente os meus sentidos)
toldam de sombras o teu rosto.

O meu rosto não reflecte a tua imagem
o meu silêncio não te deixa falar,
o meu corpo não deixa que se juntem
as partes dispersas de ti em mim.

Eu sou talvez
aquele que procuras,
e as minhas dúvidas a tua voz
chamando do fundo do meu coração.

Manuel António Pina



Não tenhas medo, ouve:
É um poema
Um misto de oração e de feitiço...
Sem qualquer compromisso,
Ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Poderás decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar,
Ao levantar,
Ou nas restantes horas de tristeza
Na segura certeza
De que mal não te faz.
E pode acontecer que te dê paz...

Miguel Torga





E desde então sou porque tu és
E desde então és
sou e somos.
E por amor
Serei, serás, seremos.

Pablo Neruda



Tu es a luz, a minha vida
Vives e por ti eu vivo
Existes e contigo deliro
Es o meu sol, a minha chuva
Es o frio que me faz aquecer
E o calor que me despe
Es fogo e gelo, toque e suspiro sem medo
Es o sonho real
E o beijo que me faz perder o norte
Es a voz que me embala
E o colo que me protege
Es a alegria e a tristeza
Es o abraço fechado
Que sinto com carinho
Es lua e sol em tempo de verao
Es o tudo que sonhei e quis
Tu es simplesmente
A mulher da minha vida
(AO)



Não me mostrem o tempo cinzento
Fechando as cortinas ao sol,
Não insistam que o outono da vida
É sinônimo de descanso
A exigir, simplesmente,
O cultivo do já semeado.
Sem esperas, sem aguardo do que pode vir,
Não me impeçam de sentir.
(AO)




Não te chamo para te conhecer
Eu quero abrir os braços e sentir-te
Como a vela de um barco sente o vento

Não te chamo para te conhecer
Conheço tudo à força de não ser

Peço-te que venhas e me dês
Um pouco de ti mesmo onde eu habite

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN



Amo o teu túmido candor de astro
a tua pura integridade delicada
a tua permanente adolescência de segredo
a tua fragilidade acesa sempre altiva

Por ti eu sou a leve segurança
de um peito que pulsa e canta a sua chama
que se levanta e inclina ao teu hálito de pássaro
ou à chuva das tuas pétalas de prata

Se guardo algum tesouro não o prendo
porque quero oferecer-te a paz de um sonho aberto
que dure e flua nas tuas veias lentas
e seja um perfume ou um beijo um suspiro solar

Ofereço-te esta frágil flor esta pedra de chuva
para que sintas a verde frescura
de um pomar de brancas cortesias
porque é por ti que vivo é por ti que nasço
porque amo o ouro vivo do teu rosto



António Ramos Rosa, in 'O Teu Rosto'



"Não quero rosas, desde que haja rosas
Quando o vazio branco destas noites
Se gastar, quando a névoa deste instante
Sem forma, sem imagem, sem caminhos,
Se dissolver, cumprindo o seu tormento,
A terra emergirá pura do mar
De lágrimas sem fim onde me invento."

Eugénio de Andrade


Poesia
  
E o passado é o presente na lembrança.
Quem fui é alguém que amo
Porém somente em sonho.
E a saudade que me aflige a mente
Não é de mim nem do passado visto,
Senão de quem habito
Por trás dos olhos cegos.
Nada, senão o instante, me conhece.
Minha mesma lembrança é nada, e sinto
Que quem sou e quem fui
São sonhos diferentes.

Ricardo Reis
"Odes"


  

Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.


(Miguel Torga)




pesadas, fundas,
esperarei por ti 
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça."
no rumor do vento, 
onde esteve a linha 
pura do teu rosto 
ou só pensamento 
- e mora, secreto, 
intenso, solar, 
todo o meu desejo - 
aí vou colher 
a rosa e a palma. 
Onde a pedra é flor, 
onde o corpo é alma. "
Quero-as só quando não as possa haver.
Que hei-de fazer das coisas
Que qualquer mão pode colher?
Não quero a noite senão quando a aurora
A fez em ouro e azul se diluir.
O que a minha alma ignora
É isso que quero possuir.

Para quê?... Se o soubesse, não faria
Versos para dizer que inda o não sei.
Tenho a alma pobre e fria...
Ah, com que esmola a aquecerei?..."

(Fernando Pessoa)



"Identidade"

Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço

(Mia Couto)



Quando se tem um grande amor
O vento sempre sopra a favor
Se não existe a compreensão
O vento se torna um furacão

Lealdade ,companheirismo ,amizade
Fidelidade, honestidade, cumplicidade
Isto é amor de pura verdade
Não importando a idade

Amor na terceira idade
Tudo fica mais fácil
Pois já tiveram infelicidade
com as experiências vividas

Uma brincadeirinha aqui e ali
ativando a sexualidade
Com muita criatividade
esquecendo o fator idade

Fazendo tudo bem demorado
Até adquirir sensação relaxado
O prazer vem mais prolongado
Com certeza chega ao orgasmo

Acima dos sessenta anos
Se torna tudo engraçado
O orgasmo é mais demorado
E o prazer... é redobrado!


Desconhecido


"O Amor é o Amor"
O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?...

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espírito e calor!

O amor é o amor — e depois?

(Alexandre O'Neill, in 'Abandono Vigiado')





Conto de Fadas

Eu trago-te nas mãos o esquecimento

Das horas más que tens vivido, Amor!

E para as tuas chagas o ungüento

Com que sarei a minha própria dor.


Os meus gestos são ondas de Sorrento...
Trago no nome as letras duma flor...
Foi dos meus olhos garços que um pintor
Tirou a luz para pintar o vento...

Dou-te o que tenho: o astro que dormita,
O manto dos crepúsculos da tarde,
O sol que é de oiro, a onda que palpita.

Dou-te, comigo, o mundo que Deus fez!
Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A princesa de conto: "Era uma vez..."

(Florbela Espanca)




Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.

Detonaste o pacto.

Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.

Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.

Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.

(Carlos Drummond de Andrade)




 Faz de conta que sou abelha.
- Eu serei a flor mais bela
- Faz de conta que sou cardo.
- Faz de conta que sou potro.
- Faz de conta que sou choupo.
- Faz de conta, faz de conta.

Eugénio de Andrade



“Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.

O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada”.

(Miguel Torga)



Não estejas longe de mim um só dia, porque como,
porque, não sei dizê-lo, é comprido o dia,
e te estarei esperando como nas estações
quando em alguma parte dormitaram os trens.

Não te vás por uma hora porque então
nessa hora se juntam as gotas do desvelo
e talvez toda a fumaça que anda buscando casa venha matar ainda meu coração perdido

Ai que não se quebrante tua silhueta na areia,
ai que não voem tuas pálpebras na ausência:
não te vás por um minuto, bem-amada,

porque nesse minuto terás ido tão longe
que eu cruzarei toda a terra perguntando
se voltarás ou se me deixarás morrendo

(PABLO NERUDA)



As palavras aproximam:
prendem-soltam
são montanhas de espuma
que se faz-desfaz
na areia da fala

Soltam freios
abrem clareiras no medo
fazem pausa na aflição

Ou então não:
matam
afogam
separam definitivamente

Amando muito muito
ficamos sem palavras.

(Ana Hatherly)



Sorri quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos vazios

Sorri quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador

Sorri quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados doridos

Sorri vai mentindo a sua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz

(Charles Chapin)


O amor é o amor - e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?..

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor,
e trocamos - somos um? somos dois? -
espírito e calor!
O amor é o amor - e depois?!

(Alexandre O´Neill)


Nossa Senhora faz meia,
Com linha feita de luz
O novelo é lua cheia
E as meias são para Jesus.
Quando a noite é escura e bela,
Diz-se lá na minha aldeia,
Que à janela duma estrela
Nossa Senhora faz meia,
A rodar em dobadoura
Andam quatro anjinhos nus
Prendendo nossa Senhora
Com linha feita de luz.
Jesus pequenino e loiro
Na linha todo se enleia,
As quatro agulhas são d'oiro
E o novelo é lua cheia.
Dormem as coisas mais santas,
Só a mãe santa produz
Faz serão até às tantas
E as meias são para Jesus.

Autor Desconhecido.




Amanhã.
Hoje não.
Hoje fico alegre.
E todos os dias,
por mais amargos que sejam,
Eu digo:
Amanhã fico triste,
Hoje não.
Para Hoje e todos os outros dias!!"

(Encontrado na parede de 1 dormitório de crianças do campo de extermínio nazista de Auschwitz)


Tomara
Que você volte depressa
Que você não se despeça
Nunca mais do meu carinho
E chore, se arrependa
E pense muito
Que é melhor se sofrer junto
Que viver feliz sozinho

Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz

E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais...

(Vinícius de Moraes)

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